Uma nakoada pela arte

Giulia Garcia, ARTE! Brasileiros, 23 Agosto 2022

Guiada por uma ética indígena baniwa, "Nakoada" impulsiona reflexões sobre o centenário da Semana de Arte Moderna, o futuro da arte e as estruturas museais; a mostra fica em cartaz no MAM Rio até 27 de novembro.

 

Uma serpente atravessa o Salão Monumental do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, deglutindo obras modernistas, criações de diferentes comunidades indígenas e engolindo a própria arquitetura do museu. O que talvez pareça um conto é a proposta expográfica de Nakoada: estratégias para a arte moderna, em cartaz até novembro de 2022. Desapegada do cubo branco, a exposição é construída a partir da silhueta de uma cobra, e é caminhando por seu corpo que tomamos contato com a seleção de trabalhos expostos. 

 

Com curadoria de Denilson Baniwa e Beatriz Lemos, a mostra entra para a longa lista de programações que buscam dialogar com o centenário da Semana de Arte Moderna, reunindo obras das coleções do MAM Rio — especialmente a de Gilberto Chateaubriand, que reúne um importante e vasto acervo do período e está em comodato com a instituição há anos — peças do Museu do Índio e trabalhos de artistas contemporâneos. Porém, ao invés de um caráter celebratório ou crítico frente à efeméride, a mostra propôs uma outra estratégia: trabalhar perspectivas de futuro, e o fez impulsionada por uma ética baniwa, a koada. 

 

“Não tem uma tradução que satisfaça o valor da palavra ‘koada’. Ela pode ser entendida como vingança, troca, revolta, retomada…”, explica Denilson em entrevista à arte!brasileiros. Trata-se de uma estratégia de guerra do povo Baniwa da região do Alto Rio Negro, no Amazonas. Praticada a partir do estudo da cultura e dos saberes de outros povos – permitindo uma compreensão do contexto presente a partir da avaliação de situações passadas -, ela visa dar continuidade à existência da própria comunidade. Já o termo ‘na’ “é um prefixo que significa ‘nossa’ ou ‘nós’. Então nakoada seria ‘nossa retomada’, ‘nossa restituição’, ‘nossa revolta’, ‘nossa volta’, coisas desse tipo”, completa o curador.